Com custo de R$ 336 mil mensais, transporte de 800 alunos tem atrasos e reclamações de calor em viagens de 50 km em Campinas
10/09/2025
(Foto: Reprodução) Alunos são transferidos para escola 27 km de distância por conta de reformas
EPTV/Reprodução
Ao custo de R$ 336 mil por mês, os ônibus contratados por Campinas (SP) para levar 800 alunos em viagens de mais de 50 km para estudar são alvos de reclamações dos pais por excesso de calor, além dos atrasos registrados nos dois primeiros dias da operação.
Em nota, a prefeitura confirmou que o contrato não prevê ar-condicionado nos veículos, e destaca que a Secretaria de Educação está "em diálogo constante com a empresa responsável para que o horário seja cumprido corretamente nos próximos dias".
Desde segunda (8), estudantes do 1º ao 9º ano do ensino fundamental da EMEF Padre Leão Vallerié, do Parque Valença, precisam se deslocar para um novo prédio a 27 km de distância, em trajeto que resulta na perda de pelo menos duas aulas por dia.
A situação fez o Ministério Público (MP) instaurar inquérito civil público para apurar prejuízo escolar de alunos que percorrem longos trajetos por 3 horas de aula por dia.
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Ao g1, Cristiane Machado, professora da Faculdade de Educação da Unicamp, destacou que o período perdido no trânsito causa grande impacto aos estudantes do ensino fundamental.
Mãe de uma menina de 8 anos, aluno do 2º ano, Drielle Cristina do Nascimento conta que a filha sofreu com dor de cabeça após o primeiro dia do transporte de ônibus.
"Ela reclamou que estava muito calor, ficou com mal-estar, dor de cabeça. Criança não costuma ter dor de cabeça. Estava muito calor, e o ônibus não tinha ar-condicionado. Quando o ônibus voltou ao terminal, estava com os vidros abertos. Hoje (terça), também", conta.
Segundo Drielle, a situação pelo qual a filha está passando é estressante. Ela conta que tentou vaga em uma unidade da rede estadual, mas não obteve sucesso. E diz que terá de esperar o próximo ano para saber se poderá mudar a menina de escola.
"Essa situação é preocupante, ela está no processo de aprendizagem, e é uma perda muito grande (as aulas a menos). Minha preocupação também é essa", conta.
Ao g1, uma mãe também relatou sobre a falta de banheiro nos ônibus, o que classificou como um problema para as crianças menores com as longas distâncias que elas têm enfrentado.
Sobre os horários, embora a programação informada pela prefeitura era de que os ônibus deixassem o Terminal Campo Grande às 6h50, nesta terça (9) alguns ônibus chegaram para pegar os alunos depois das 7h.
Questionada, a prefeitura confirmou que além do ar-condicionado, não há qualquer previsão de obrigatoriedade de banheiros nos ônibus.
Sobre o atraso, disse que o problema nesta terça "foi ocasionado por problemas no trânsito até o terminal do Campo Grande, onde está sendo realizado o embarque dos alunos".
Quanto custa o transporte?
Ao g1, a Secretaria de Educação informou que a operação para levar os 800 alunos da EMF Padre Leão Vallerié, a partir do antigo Terminal Campo Grande ao Colégio Fitel, em trajeto de cerca de 27 km, vai custar R$ 336.966,84 mensais.
Isso representa um custo de R$ 20,05 por dia por aluno (ida e volta), o que significa R$ 421 por mês para o transporte de cada estudante.
Segundo a pasta, há uma tomada de preço com a empresa e que só há o pagamento pelo transporte a medida que ele é realizado.
Após reforma, 800 alunos da rede municipal de Campinas são transferidos para outro prédio
MP apura o caso
A Promotoria de Infância e Juventude do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) instaurou inquérito civil público, nesta terça-feira (9), para apurar a situação dos 800 alunos que enfrentam viagens de mais de 50 km de ônibus para estudar e assistem apenas três horas de aula por dia.
Na portaria que instaurou o inquérito, o promotor Rodrigo Augusto de Oliveira destaca a preocupação dos pais e responsáveis com a segurança dos estudantes e com o prejuízo à educação, sendo que a previsão é de que as obras durem pelo menos 9 meses.
Além disso, o promotor destacou o posicionamento do representante da Secretaria de Educação de "não haver nenhum plano para isso e muito menos voltar atrás no plano adotado".
Após a repercussão do caso, o prefeito Dário Saadi recuou da decisão da Secretaria de Educação e afirmou que as aulas dos 800 alunos serão repostas. No entanto, o esquema ainda não foi definido.
Questionamentos
O objeto do inquérito instaurado pela Promotoria de Infância e Juventude tem como foco apurar as reformas estruturais na escola e suas consequências imediatas, que tem obrigado os estudantes a se deslocarem mais de 50 km (ida e volta) por dia para estudar.
O promotor determina que o município de Campinas seja oficiado do procedimento, e que preste as seguintes informações em até 5 dias:
Qual o motivo que levou a essa situação dos alunos não poderem estudar neste momento na escola Padre Leão Vallerie?
Em sendo obras de reforma, quais são as obras previstas? A prefeitura não poderia ter programado isso para o período de férias escolares?
Qual o prazo previsto para a conclusão das obras?
No que se refere ao transporte dos estudantes para a escola Fitel, quantos estudantes estão sendo transportados, de quais séries e de que forma?
Segundo notícia veiculada na EPTV, o terminal de embarque e desembarque está com o banheiro masculino interditado e sem bebedouro de água, o que é que se pretende fazer para resolver essas questões e em qual prazo?
Qual o horário previsto para início e término das aulas?
Qual o horário previsto de intervalo para a alimentação dos estudantes? Ele é suficiente?
As aulas estão começando no horário previsto?
Haverá reposição de aulas perdidas, de que forma?
Há a possibilidade, durante esse período de reforma, que os estudantes sejam inseridos em outra(s) escola(s) mais próxima(s) de suas residências?
Reunião marcada. Além disso, o promotor já deixou designada uma reunião por videoconferência, nesta sexta-feira (12), a partir das 15h30.
Devem participar uma mãe ou pai acompanhado do estudante da Padre Leão Vallerié, representantes da Secretaria de Educação e da municipalidade, além de vereadores que participam de comissões envolvidas com Infância e Juventude e Educação.
O que diz a prefeitura?
O g1 procurou a prefeitura de Campinas para comentar a decisão do MP em instaurar o inquérito para apurar a situação dos alunos.
Em nota, a administração defendeu que os problemas levantados pelo inquérito do Ministério Público em relação ao transporte de alunos da EMEF Padre Leão Vallerie "já foram ou estão sendo sanados", e que a prefeitura "está à disposição para prestar mais informações no âmbito do inquérito".
Veja a nota na íntegra:
"Os problemas levantados pelo inquérito do Ministério Público em relação ao transporte de alunos da EMEF Padre Leão Vallerie já foram ou estão sendo sanados.
Sobre os questionamentos feitos no inquérito, cabe ressaltar:
A mudança temporária dos estudantes foi necessária para obras de troca do telhado, rede elétrica e janelas. Um dos motivos da reforma é a necessidade de preparar a estrutura para a instalação de aparelhos de ar-condicionado. A saída dos alunos durante a reforma é necessária por questões de segurança.
Em virtude da amplitude da obra, o prazo estabelecido pela empresa é de nove meses, ou seja: não há como realizar a reforma apenas no período de férias escolares.
Ao todo 800 estudantes estãos sendo transportados, do Fundamental I e II, que vão e voltam para a escola Fitel por meio do transporte escolar.
O horário previsto para início e término das aulas é das 7h30 às 11h20 (turma da manhã) e das 13h30 às 17h20 (turma da tarde).
O horário de intervalo é das 10h às 10h20 e 10h30 às 10h50 (manhã) e das 15h05 às 15h25 e 15h30 às 15h50 (tarde). Os alunos são divididos por turmas no momento da alimentação escolar para melhor conforto.
A reposição será realizada de forma presencial, em um modelo que ainda está sendo definido junto ao Conselho Escolar.
A decisão de transferir os alunos para a escola Fitel foi tomada após reuniões realizadas com os membros do Conselho Escolar e com os responsáveis pelos alunos. Antes de acordar com o Conselho da Escola (órgão colegiado) - composto por pais, alunos, professores e funcionários - a Secretaria de Educação mapeou prédio tanto no bairro quanto na região do distrito do Campo Grande, que pudessem comportar uma escola, mas não foi possível encontrar o espaço porque os locais disponíveis eram pequenos e não comportavam uma escola ou não tinham documentação necessária para a contratação por parte da Prefeitura.
A Prefeitura de Campinas reitera que está à disposição do Ministério Público para prestar mais informações no âmbito do inquérito."
Impacto para os alunos
A perda das aulas por estudantes do 1º ao 9º ano do ensino fundamental da EMEF Padre Leão Vallerié durante o trajeto de ônibus para a nova escola é classificada como significativa pela professora Cristiane Machado, da Faculdade de Educação da Unicamp.
A professora do Departamento de Políticas e Administração de Sistemas Educativos (Depase) destaca que o período que o aluno passa na escola é importante, com grande impacto no ensino fundamental, e que a reposição, que é possível, deve ser bem articulada, inclusive com os pais.
"Eu parto do princípio de que a escola é importante. As quatro horas que os estudantes passam são importantes. Então, o que a gente tira dessas quatro horas, ainda mais com essa frequência, com essa constância, vai fazer falta, sim. É possível compensar? É. De uma forma mais organizada, orquestrada, articulada com os pais, inclusive", diz.
Cristiane reforça a importância das aulas para os estudantes do ensino fundamental, e que eventual perdas podem trazer grandes prejuízos educacionais.
"Estamos falando de educação básica. Educação básica é a educação infantil, o fundamental e o médio pela nossa legislação. Nós estamos falando que do básico, essa parte é fundamental. Então, se é fundamental, os fundamentos de toda educação básica estão lá", reforça.
Ao falar sobre articular com os pais, a professora da Unicamp reconhece o papel das famílias em todo o processo, mas diz que não é possível transferir aos pais a responsabilidade pedagógica, como a reposição do conteúdo perdido em atividades para serem feitas em casa.
"Qualquer atividade que você manda para casa, você precisa da ajuda dos pais para os estudantes fazerem. Mas também nós temos que pensar assim: os pais precisam trabalhar. Você não pode transferir para os pais essa responsabilidade que é da escola. Essa responsabilidade da escola de cuidar do pedagógico, dessas quatro horas diárias, no mínimo", completa.
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EMEF Profª Sylvia Simões Magro fechada para reforma
EPTV/Reprodução
Prefeitura recua em 2ª escola
Após a repercussão negativa da transferência de 800 alunos para escola que fica a 27 quilômetros de distância por conta de obras, a prefeitura de Campinas voltou atrás na decisão de usar a mesma estratégia com outra escola, nesta terça-feira (9).
Os 491 estudantes da EMEF Professora Sylvia Simões Magro, no Jardim Ipaussurama, seriam transferidos para o antigo Colégio Educap, que fica na Avenida Imperatriz Leopoldina, na Vila Nova, um trajeto de 10 quilômetros que dura cerca de meia hora. O motivo é o mesmo: reforma.
A mudança atingiria todos os alunos do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental e da Educação para Jovens e Adultos (EJA). Desde a segunda-feira (8), os estudantes estão tendo aulas remotamente e seriam transferidos para o prédio provisório na próxima segunda-feira (15). A decisão já havia sido comunicada aos pais.
Em nota, a administração afirmou que a Secretaria Municipal de Educação vai reavaliar o cronograma de obras da troca de telhados e instalações elétricas da escola. Ainda de acordo com pasta, os 491 alunos da Escola Municipal Sylvia Simôes Magro retornarão às aulas presenciais a partir desta quarta (10).
Comunicado feito às famílias dos alunos da EMEF Profª Sylvia Simões Magro
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