Por que abelhas constroem favos em formato de hexágono? A resposta envolve física, biologia e cooperação
30/05/2025
(Foto: Reprodução) Formato dos favos revela como milhões de anos de evolução transformaram esses insetos em mestres da eficiência. Apis mellifera constrói colmeias com favos em forma hexagonal
Pixabay
Quando pensamos em abelhas, logo vem à mente a imagem dos favos perfeitamente hexagonais repletos de mel. Mas por que será que essas pequenas engenheiras da natureza escolheram justamente esse formato? A resposta está na ciência e envolve uma combinação de física, biologia, comportamento coletivo e milhões de anos de evolução.
Antes de mais nada, é importante lembrar que existem cerca de 20 mil espécies de abelhas no mundo. Muitas delas nem produzem mel, e algumas nem constroem colmeias. Mas a nossa imaginação costuma se fixar na mais conhecida: Apis mellifera, a famosa abelha do mel.
É ela quem constrói as células hexagonais que conhecemos, mas esse formato não começa assim. Na verdade, as células começam redondas, como pequenos cilindros.
Com o calor gerado pelo corpo das próprias abelhas e a proximidade entre as células, a cera se amolece levemente e as bordas se reorganizam, formando hexágonos - uma forma que preenche o espaço por completo, como os quadrados, mas com menos material e maior eficiência estrutural.
Abelha da espécie Apis mellifera
Muhammad Mahdi Karim / Wikimedia Commons
Elas ‘sabem’ fazer isso?
Não exatamente, pois não há um plano arquitetônico. As abelhas seguem regras simples de construção que foram moldadas ao longo do tempo por processos evolutivos. A simetria dos favos surge da ação coletiva: cada abelha trabalha em conjunto com as demais, respeitando um padrão coordenado que favorece a repetição e a eficiência do desenho.
Aqui, vale uma analogia interessante com as pirâmides: muitas pessoas veem algo místico no fato de várias civilizações antigas terem construído pirâmides, mas a explicação mais simples é que o formato piramidal é uma das estruturas mais estáveis para empilhar pedras. Inclusive, há evidências de pirâmides com outros formatos que ruíram ao longo do tempo.
“Assim, os engenheiros da época aprenderam, por tentativa e erro, quais formas funcionavam melhor. O mesmo aconteceu na evolução dos ninhos de abelhas. Isso são exemplos de comportamentos e estratégias evolutivamente selecionadas”, explica o entomólogo Vinicius Marques Lopez.
É como se a natureza tivesse feito, ao longo de milhões de anos, testes e mais testes e a forma que venceu foi o hexágono.
Apicultores muitas vezes reproduzem esse formato em colmeias artificiais
Pixabay
Outros insetos, como algumas espécies de vespas sociais do gênero Polistes, também constroem ninhos com células hexagonais. Isso mostra que a forma é uma solução evolutiva eficiente, adotada por diferentes grupos diante dos mesmos desafios: economizar material, maximizar espaço e garantir estabilidade estrutural.
Ciência, calor e comportamento
Do ponto de vista científico, a explicação para os favos hexagonais é multifatorial. O calor gerado pelas abelhas amolece a cera, permitindo que forças semelhantes à tensão superficial ajam nas bordas das células.
Ao mesmo tempo, o comportamento coletivo faz com que várias células sejam construídas lado a lado, promovendo o encaixe perfeito. “Comportamentalmente, essas abelhas constroem várias células ao mesmo tempo, muito próximas umas das outras, o que naturalmente leva à formação de um padrão regular e compacto”, comenta Lopez.
E, do ponto de vista evolutivo, colônias que constroem com mais eficiência conseguem economizar energia e produzir mais mel - uma vantagem muito bem-vinda na natureza.
“O hexágono é uma forma especial porque preenche completamente o espaço, como os quadrados, mas com menos material para o mesmo volume. Isso significa que a colônia pode armazenar mais mel e criar mais espaço para as crias usando menos cera, que é energeticamente muito custosa para as abelhas produzirem”, diz Vinicius.
Mas os cientistas ainda discutem os detalhes desse processo. Pesquisas recentes indicam que a ação mecânica das abelhas moldando a cera também pode ser relevante, o que torna essa dança complexa entre física, biologia e cooperação em um enigma ainda a desvendar.
O que os humanos aprenderam com as abelhas?
Segundo o especialista, as abelhas inspiram engenheiros e designers há séculos. O formato dos favos já foi replicado em setores como o aeroespacial, automotivo e até mesmo na fabricação de materiais resistentes e leves usados em embalagens e equipamentos de segurança.
Além disso, o comportamento social das abelhas e suas adaptações corporais estão no radar de cientistas da biomimética, um campo que busca imitar soluções da natureza para criar novas tecnologias.
Pesquisadores da UFTM, USP e da Universidade de Milão, por exemplo, já estudaram as superfícies corporais de insetos do grupo Hymenoptera (que inclui abelhas, formigas e vespas) para aplicações que vão da robótica, ao monitoramento ambiental e à medicina.
Para Vinicius, conhecer a fundo esses insetos nos ajuda a entender como a natureza encontra soluções eficientes para resolver problemas de diversos tipos.
“Ainda há muito a se descobrir sobre esses organismos incríveis, e isso reforça a importância da sua conservação. Estamos perdendo conhecimento, serviços ecossistêmicos e potenciais fontes de inovação tecnológica antes mesmo de compreendê-los plenamente. Por isso, conservar as abelhas é também preservar oportunidades futuras para a ciência e a sociedade”.
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